sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

A genealogia musical de Moreno Veloso

Se os talk-shows foram a melhor novidade do Humaitá pra Peixe 2008, o novo evento teve seu ponto alto no dia 14 de janeiro, quando o trio +2 + Pedro Sá foram os convidados de Bruno Levinson no Cinematèque Jam Club. Vamos evitar aqui o jornalismo requentado, pois a noite foi relatada com minúcia no site do festival. Esta postagem é dedicada exclusivamente a um de seus integrantes. Histórias e piadas a parte, as melhores músicas da noite saíram de sua voz e seu violão.

Moreno-show
A formação musical de Moreno Veloso precede o seu nascimento. Na barriga de sua mãe, ele já se fazia presente na sala da música, aquele espaço da casa reservado a ouvir e a tocar canções, onde muito provavelmente foram criados alguns clássicos da música brasileira. Se pela memória Moreno não consegue chegar à raiz, se vale do primeiro registro musical a ele dedicado. A canção de ninar "Tudo tudo tudo", gravada à capela, com o ritmo marcado na palma da mão, pelo pai no disco Jóia, de 1975, cuja capa foi censurada por trazer o pai Caetano, a mãe Dedé e o filho Moreno ao natural, despidos de quaisquer pudores em uma época de valores morais ditados por um regime que pregava a liberdade de reprimir em nome de Deus, da pátria e da família. "Tudo comer / tudo dormir / tudo no fundo do mar", "é só isso", cantou Moreno, justificando-se diante da insistência de Bruno.

Ainda no remoto terreno da infância, "Só vendo que beleza" foi lembrada como a primeira música que caiu no gosto do menino Moreno. Acompanhado pelo pai ao violão - como mais tarde ele viria a registrar em Máquina de Escrever Música, estréia fonográfica do trio -, Moreno costumava cantar a primeira parte da canção. Ao cantá-la naquela noite, ele se esquece da progressão harmônica que conduz à segunda parte. É imediatamente socorrido pela voz de Kassin, cantando levemente fora do tom. A ironia é que logo antes, Moreno havia brincado dizendo que Kassin não gostava de música brasileira, dando início a uma breve e carinhosa discussão. Terminado o número, sob aplausos do público presente, constrangido, Moreno sussura: "eu errei". Bem, não se tratou de um erro, mas sim um regresso aos tempos de criança.

Só Vendo que Beleza



Pendores musicais, Moreno tinha, sem dúvida. Mas foi na casa de Gilberto Gil que ele se aproximou do violão. Um dia, ao chegar lá, encontrou os "primos" tropicalistas Pedro e Preta tomando aulas de violão com um professor e disse a Caetano que gostaria de aprender a tocar o instrumento. Mais do que um, ele teve vários professores, entre eles o próprio Gil, que lhe ensinou a tocar "Cores Vivas", "uma música que meu pai e todos lá em casa gostavam muito".

Cores Vivas



Daí a se tornar músico e compositor muito tempo se passou, mesmo com a música sempre presente em sua vida. Em 1997, no disco Livro, Caetano gravou uma canção assinada por Moreno, "How beautiful could a being be". O acento baiano, o tom maior, o flerte com o pop são algumas características do Moreno compositor que já estão presentes ali. Talvez faltasse encontrar as pessoas certas para assumir a carreira. Elas eram Kassin e Domênico Lancelotti e em 2001 foi lançado o primeiro disco da trilogia +2, justamente com Moreno a frente da banda. A partir daí, não só Moreno, mas o trio tornou-se referência obrigatória no meio independente brasileiro, especialmente na cena carioca, até alcançar projeção internacional no Japão, na Europa e nos Estados Unidos.

Neste ínterim, Moreno teve composições gravadas por sua madrinha Gal Costa, mas foi só em 2007 que, como compositor, ele emplacou um sucesso radiofônico e, por que não, popular. A irresistível "Um passo à frente", parceria com Quito Ribeiro, chamou atenção da jovem sensação Roberta Sá que pediu autorização para gravá-la em seu segundo disco. A música, no entanto, era uma das que havia sido gravada por Gal, então Moreno perguntou se a cantora gostaria de gravar uma música do repertório de Gal Costa. Ambos concordaram que não seria uma boa, mas Moreno prometeu uma música inédita a Roberta. Por não ser um compositor dos mais prolíficos, a tal música não existia. As sessões de gravação de Roberta já estavam sendo finalizadas quando Moreno a encontrou na aula de pilates. Amanhã é o último dia, ela teria dito. Ao sair da aula, Moreno ligou para o parceiro Quito e o intimou: precisamos fazer uma canção para a Roberta Sá esta noite. Quito, também fã da cantora, concordou e o resultado foi a bossa-de-roda pop-malemolente "Mais Alguém". Moreno a interpretou pela primeira vez em público no talk-show do Humaitá pra Peixe.

Mais Alguém



Noite inesquecível. Faltou apenas uma pergunta. Fechada a trilogia, o que eles pretendem fazer a seguir? Futurismo em aberto.

Um comentário:

Paulo Silveira disse...

essa musica, "mais alguem", lembra muito o enredo do filme Encontros e Desencontros (lost in translation).

Queria muito saber mais a respeito.