quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Little Joy sob a sombra de Los Hermanos

Passada quase uma semana do show do Little Joy no Circo Voador (Rio de Janeiro), aqueles que se interessam por saber como foi a passagem da banda pelo Brasil já sabem que no Rio a apresentação foi encerrada com o público cantando "Último Romance" puxada por Fabrizio Moretti quando Rodrigo Amarante já havia deixado o palco. Foi obrigado a voltar. Ao mesmo tempo em que se comprazia com o reconhecimento dos fãs de sempre, parecia um pouco desconfortável em sua fase antipopstar, experimentada nas turnês americanas e europeia da sua nova banda.

No Rio, assim como em todas as outras capitais brasileiras por onde o Little Joy passou, um dos novos prazeres descobertos por Amarante em sua experiência internacional - o de tocar para pessoas que simplesmente desconheciam seu passado de glória no pop brasileiro -, e em menor escala também por Moretti, foi anulado. O Little Joy ganhava a plateia de antemão antes do primeiro acorde. Bastava Amarante subir ao palco.

De lá de cima, o som muitas vezes descrito por aí como ensolarado e praieiro, tornava evanescente a sua origem californiana. O sabor era antes carioca com sotaque inglês. Não aquele do posto 9, da praia de Ipanema, mas um meio termo entre a Copacabana pré-bossa nova, carregando o saudosismo de um tempo indefinido, e a Barra da Tijuca com seus quilômetros de areia a perder de vista e seus shoppings que remetem a Nova York. E aí se faz a costura entre as duas pontas, ou entre as duas cabeças do Little Joy. Rio e Nova York. Los Hermanos e Strokes. No palco estas referências são mais óbvias e reconheciveis do que o clima californiano identificado em massa pela imprensa brasileira à falta de uma definição melhor.

As melodias guiadas pela voz de Amarante contornam suas antigas composições. As harmonias roqueiras com levadas que remontam aos primórdios do rock - muito antes do revival promovido pelos Strokes - evitam as dissonâncias que fizeram dos Hermanos um saudável corpo estranho no rock nacional dando um frescor atemporal às canções. Da sonoridade da banda de Moretti, curiosamente, há a retidão da bateria, a cargo de Matt Romano. O terceiro elemento - Binki Shapiro - torna-se coadjuvante, pequeno como a sua voz, bela, mas por vezes claudicante, diante dos dois astros reconhecidos como tal pelos brasileiros. O fato é que no disco, os climas e os arranjos são mais bem resolvidos e a conjunção destes elementos ficam mais diluídos e uniformes.

Mas, enfim, nada disso importa ao público carioca. Amarante não cansa de repetir que agora, sim, está de volta para casa. Para a maioria é o que basta. Estavam com saudade de ouvi-lo cantar, embora devam ter sentido falta das dancinhas enérgicas durante os momentos de maior vigor instrumental. A língua estrangeira não chegou a ser uma barreira, embora tenha limitado o coro a apenas alguns trechos de determinadas canções. E assim transcorreu o show. Previsível para o público tanto quanto para os artistas.

Quando tudo estava encerrado, o animado Moretti resolveu fugir ao script, improvisando sobre o final feliz. Veio então o êxtase. Coisa semelhante acontece nos shows de Marcelo Camelo. A diferença é que este contempla os fãs com alguns números da banda em recesso. O fato de suas letras serem em português também faz com que algumas das canções de Sou alcancem ressonância semelhante a dos sucessos do passado. Depois de puxar o coro, Moretti ia deixando Amarante sozinho no palco, mas este o puxou pelo braço e o tirou pra dançar ao som de "Último Romance". Não há dúvida de que ele prefere os pequenos prazeres que descobriu com o seu novo brother do que a idolatria compartilhada com seus velhos hermanos.

Plateia em êxtase sob os olhares e os ouvidos de Amarante e Camelo por acmyit


Que o momento mais emocionante do show tenha sido aquele em que o espectro do Los Hermanos tomou conta do Circo mostra que a antiga banda de Rodrigo Amarante e Marcelo Camelo, no todo, ainda ocupa o coração dos fãs para muito além de cada uma de suas partes em separado. Mesmo que Amarante, na companhia de Binki e Moretti, e Camelo, acompanhado pelo Hurtmold, transmitam muito mais verdade e alegria atualmente, seja no palco ou em estúdio. Bem, pelo menos é o que parece. Resta ver como será nos dias 20 e 22 de março na abertura do Radiohead.

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